O fato que há 40 anos, o Brasil ansiava pela aprovação de uma “Reforma Tributária”. Porém, na proposta aprovada em votação na Câmara dos Deputados que teve início no começo da noite de quinta-feira (6) e invadiu a madrugada de sexta-feira (7), há uma gama de controvérsias e impactos em setores produtivos importantes para o desenvolvimento do País ainda incertos. A votação no 1º turno teve 382 votos a favor e 118 contra. Já no segundo turno, os números sofrerem uma pequena alteração, com 375 a favor e 113 contra. Dos 30 deputados federais paranaenses, 27 foram favoráveis à Reforma Tributária e três se posicionaram contrários.

Michel Lopes analisa reforma

Uma das sumidades na área contábil do Paraná, o atual presidente do Sescap-PR (Sindicato das Empresas Contábeis, Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas do Paraná) e ex-presidente da Acic, Michel Vitor Lopes, conversou com o Jornal O Paraná e fez uma análise do primeiro reflexo da aprovação da reforma que ainda precisa do endosso do Senado, para posteriormente ir à sanção presidencial. “Prioritariamente, precisamos levar em consideração dos fatores fundamentais”, aponta ele. “Se me permitem a analogia, essa reforma tributária é o mesmo que oferecer a uma pessoa um sapato 40 se ela calça 42”, diz. Para Lopes, o governo federal tem ultrapassado o limite do gasto público – e por isso precisa ampliar a arrecadação. “Hoje, a relação arrecadação e PIB [Produto Interno Bruto] é de 37%, um absurdo, se comparada a outras nações desenvolvidas”.

Municipalista, Michel Lopes defende a discussão de uma reforma administrativa, ainda antes de se pensar na tributária. O segundo fator apontado por ele como fundamental é a necessidade que os recursos gerados pelos tributos, permaneçam nos municípios, sem precisar ser direcionado à esfera federal. “Pelo menos, uma boa parte dos tributos ficar aqui para gerar mais desenvolvimento, nas áreas da saúde, educação e segurança pública”. Para Lopes, o texto aprovado na Câmara fere esse princípio e tira a autonomia dos municípios de forma geral e prejudica o repasse, comprometendo o processo de evolução administrativa e social, como é o caso de Cascavel.

“Estados no lucro”


Já para os governadores, a reforma tributária é vista com bons olhos especialmente para determinados estados, como por exemplo, o Paraná. “Os governadores conseguiram colocar as emendas aglutinativas. Para os estados do sul ficou bom, com a possibilidade, agora, do índice populacional, ser levado em consideração”. O contabilista aponta melhorias na redação da reforma, em comparação com o que tinha sido apresentado no início da semana. “O repasse aos municípios deve ser levado em consideração. Mas, no modelo atual, os municípios são os grandes prejudicados”.
A aprovação da reforma tributária por parte dos deputados federais já era carta marcada desde o início da semana. “Não houve nenhuma surpresa ao setor produtivo, porém, esse texto precisa ser melhorado”, enfatiza, se referindo ao IVA (Imposto de Valor Agregado) dual, segregado entre os impostos federais e o que é chamado de CBS (Contribuição de Bens e Serviços), englobando PIS/Cofins e do outro lado, o IVA entre os estados, ajustando o ICMS e o ISS, formando desta forma o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
O Senado precisa analisar com muito critério o texto final da reforma tributária, na ótica do Michel Lopes. “Acredito que alguns setores foram extremamente impactados com uma oneração considerável, principalmente o segmento de serviços, uma vez que tínhamos no texto inicial, um prejuízo latente para o agro, porém, a Frente Parlamentar do Agronegócio da Câmara conseguiu grandes avanços na redação”.

Mais avanços?


Dúvidas também pairam sobre como vai ficar a cobrança de impostos como o IPTU e IPVA. No primeiro, Michel Lopes explica que os prefeitos passam a ter mais autonomia para fazer a correção dos valores e da base de cálculo, agora por meio de decretos, não necessitando o envio para o Legislativo.
Agora, o texto segue para análise do Senado. “Não acredito em grandes avanços a partir da próxima etapa. Pelo menos uma boa parte desse conteúdo deve ser mantida, com pequenos ajustes, mas nada que comprometa a estrutura aprovada pela Câmara”, pontuou Lopes.

Impacto no agro


Os deputados zeraram a alíquota do futuro Imposto sobre Valor Adicionado para itens a serem definidos em lei complementar, que ainda será votada, e também para frutas, produtos hortícolas e ovos. A lei vai criar a “cesta básica nacional de alimentos”. A reforma tributária prevê três alíquotas. Como regra geral, haverá a alíquota única, uma reduzida em 60% e uma alíquota zero para produtor rural pessoa física, além de remédios e Prouni (Programa Universidade Para Todos).
Entre os itens que terão alíquota 60% menor que a cheia, estão os produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura que ficarem foram da cesta básica nacional (além de outros segmentos, como transporte público, saúde, educação, cultura), insumos agropecuários e alimentos destinados ao consumo humano.
A cobrança ocorrerá no destino (local do consumo do bem ou serviço), e não na origem, como ocorre hoje. Haverá desoneração de exportações e investimentos, duas mudanças que beneficiam diretamente o agronegócio.

O que diz o governador do Paraná


O governador Ratinho Junior afirmou na sexta-feira (7) que a aprovação da reforma tributária na Câmara dos Deputados representa um grande avanço para o Brasil. A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que unifica impostos sobre o consumo foi aprovada em dois turnos na madrugada de sexta e agora segue para a apreciação do Senado. “Há muito tempo o País esperava avançar na modernização tributária, o que em países do primeiro mundo já foi feito há décadas. O Brasil tem uma legislação extremamente complexa, que traz dificuldades aos empresários, comerciantes e à população de um modo geral”, disse Ratinho Junior. “A reforma tributária é, acima de tudo, uma vitória da sociedade, que vai ter um sistema mais moderno e com mais transparência. Ela melhora a fiscalização e permite que o setor produtivo, que gera empregos, tenha uma vida tributária mais facilitada”.
Ratinho Junior destacou também a adaptação do texto que foi à votação, que permitiu uma composição mais igualitária do Conselho Federativo. O órgão será formado por representantes dos estados e municípios e será responsável por administrar a arrecadação do novo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que deverá unir o ICMS, atualmente direcionado aos estados, e ISS (Imposto sobre Serviços), destinado aos municípios.
No início da semana, governadores dos estados que integram o Cosud (Consórcio de Integração Sul e Sudeste) e o Codesul (Conselho de Desenvolvimento e Integração Sul) se reuniram com suas bancadas federais para buscar um acordo sobre o novo órgão. A proposta defendida pelos estados do Sul e Sudeste, em especial Paraná, Santa Catarina e São Paulo, era que o conselho refletisse o real peso dos estados, levando em conta a proporcionalidade de suas populações.
“Esse foi um avanço gigante na votação de ontem para que não existam diferenças regionais na composição do Conselho, e mostrou a maturidade do Congresso, dos deputados e governadores por conseguirem achar pontos de equilíbrio entre todas as regiões”, salientou o governador. “Nenhuma região quer se sobrepor à outra ou ter mais força. O que queremos é que todos tenham um grau de igualdade, que os estados tenham esse equilíbrio que é tão importante para tomar as decisões para o País”.
Ele também ressaltou que o texto dá segurança aos gestores em como será feita a gestão dos impostos. “Foi importante para os governadores e também para os prefeitos, porque eles tinham muito medo de como seria esse equilíbrio dentro do Conselho Federativo”, explicou. “Acredito que o texto aprovado ficou bem equilibrado por pensar, organizar e dar segurança para todas as regiões do País”, complementou.

REFORMA TRIBUTÁRIA


A Secretaria de Estado da Fazenda elaborou uma cartilha, disponível no portal da pasta (fazenda.pr.gov.br) que explica aos cidadãos os principais pontos da reforma tributária e sua importância para o desenvolvimento econômico e a simplificação do sistema tributário brasileiro.
A reforma busca uma simplificação do sistema tributário brasileiro, com a unificação de diversos tributos, como PIS, COFINS, ICMS e ISS em um imposto sobre bens e serviços e a substituição do IPI por um Imposto Seletivo. Ela também prevê a criação de mecanismos de compensação para Estados e municípios e a revisão das regras de incentivos fiscais e benefícios setoriais.
Outro ponto importante do novo texto é a Cesta Básica Nacional de Alimentos. As alíquotas previstas para os impostos federal e estadual e municipal serão reduzidas a zero para esses produtos. No Paraná, itens da cesta básica já são isentos da cobrança do ICMS.
A reforma tributária também proporciona mais eficiência e justiça fiscal, estimula o desenvolvimento econômico e preserva a capacidade de investimentos do Paraná. Entre as principais preocupações do Estado nos debates, que ainda seguem em andamento, estão a necessidade de manter a competitividade das empresas paranaenses, especialmente as de pequeno e médio porte, e o setor rural, um dos principais motores da economia local, que tornam o Paraná um “exportador” de produtos para as demais unidades federativas.

Câmara conclui votação de destaques
e também aprova alterações no Carf

A Câmara dos Deputados concluiu a votação dos destaques da reforma tributária durante a sexta-feira (7), a PEC 45/19. Os deputados rejeitaram três dos quatro destaques do PL que suprimiam pontos do texto aprovado. A sessão foi realizada de forma semipresencial e o primeiro destaque rejeitado retirava do texto da reforma a previsão de que o imposto seletivo iria compor a base de cálculo do ICMS e do ISS, enquanto vigentes, e do IBS e CBS sobre produtos que prejudicam a saúde e o meio ambiente. O destaque foi rejeitado por 336 votos, contra 132.
O relator da PEC, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) explicou que a ideia de um imposto seletivo para esse tipo de produtos é adotada por quase todos os países. “Não vai ter efeito cascata. Vai ter impacto no preço daqueles produtos que fazem mal a saúde, basicamente a gente tem o tabaco e o álcool.”
Na sequência, os deputados rejeitaram – por 349 votos a favor, 84 contrários e duas abstenções – o destaque que pretendia retirar um dispositivo que permite a atualização da base de cálculo do IPTU por meio de decreto do Poder Executivo municipal, conforme critérios estabelecidos em lei municipal, por 370 votos a favor da manutenção do texto, com 28 contra e três abstenções.
O último destaque votado foi o que propunha retirar a prorrogação de benefícios fiscais do IPI do Norte e Nordeste e para plantas automobilísticas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste até dezembro de 2032. Apesar de ter alçando 307 votos a favor, o destaque foi aprovado, pois, por se tratar de emenda à Constituição, eram necessários 308 votos para a sua aprovação. No total, 166 deputados votaram contra o destaque e cinco se abstiveram.

Carf


Também na sexta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que dá ao representante da Fazenda Nacional o voto de desempate no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), última instância de julgamento de questões tributárias na administração federal. A proposta foi aprovada na forma de substitutivo do relator, deputado Beto Pereira (PSDB-MS), e será enviada ao Senado.

Fonte: Jornal O Paraná