Depois de declarar, na semana passada, que o Brasil “está quebrado” e, por isso, não conseguiria corrigir pela inflação a tabela do Imposto de Renda, o presidente Jair Bolsonaro mudou o discurso. Disse que a iniciativa não foi possível em 2020 por causa da pandemia, mas que pretende aumentar, em 2022, a faixa de isenção do IR para quem ganha até R$ 3 mil por mês. “Gostaríamos de passar pra R$ 5 mil. Não seria de uma vez toda, mas daria para até o fim do mandato fazer isso aí. Não conseguimos por causa da pandemia. Nós nos endividamos em mais R$ 700 bilhões, não deu pra atender. Vamos ver se, pro ano que vem, pelo menos, passe de R$ 2 mil para R$ 3 mil”, disse o presidente, durante live na noite de quinta-feira. O plano de Bolsonaro, entretanto, não é novo. Estudo do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), de 2018, já propunha que o limite de isenção fosse imediatamente corrigido para R$ 3 mil.
Com o aumento de 4,52% na inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em 2020, a defasagem acumulada saltou para 113,09%, entre 1996 e 2020. Nesses 24 anos, a variação do IPCA somou 346,69%, enquanto os reajustes nas faixas de cobrança do IR foram de 109,63%, resultando em uma diferença de 113,09%. “A correção da tabela não é apenas uma questão de justiça, mas é fundamental para a economia nesse momento de crise. É dinheiro na veia do consumidor, sobretudo, para os assalariados, que já pagam muito imposto”, afirma Kleber Cabral, presidente do Sindifisco. Ele diz, ainda, que é preciso compensar a perda de arrecadação.
“Alcançar o andar de cima, a elite econômica que paga pouco ou nada de IRPF (é fundamental), já que os lucros e dividendos no Brasil são isentos de imposto. O estudo de 2018 propõe, também, reduzir o IRPJ em cinco pontos, o que traz estímulo para o reinvestimento dos lucros na atividade econômica, enquanto hoje a indução tributária é na direção da distribuição dos lucros aos acionistas”, reforça Cabral. Outras medidas sugeridas, como o fim da dedução de juros sobre capital próprio e a tributação dos lucros ao exterior, mostram, acrescenta Cabral, “os caminhos para reequilibrar o peso da carga tributária de forma mais justa, sem comprometer as contas públicas”.
O educador financeiro Ruda Lins explica que a projeção inicial do governo era aumentar a isenção para quem ganha até R$ 5 mil, mas causaria um impacto significativo na economia e seria inviável. Na perspectiva do consumidor, os R$ 3 mil representam um ganho plausível. “Aquece o mercado. As pessoas terão mais poder de compra e a receita ganha nos trabalhos informais pode ser exposta com mais tranquilidade”, afirma.
Lins analisa que o peso nas finanças públicas dessa melhoria para o contribuinte pode ser perfeitamente ajustado a partir de um estudo antecipado de mercado. “Já no processo de distribuição de renda e circulação da moeda, será um ganho para a população, visto que os entrarem na faixa de isenção terão um custo a menos no orçamento anual e esse valor pode ser revertido para bens ou serviços que potencializem mais ainda a receita familiar”, acrescenta.
João Victor Gonçalves, analista de conteúdo na Empreender Dinheiro, ressalta que correção da tabela “é um bom modo de evitar que as rendas disponíveis dos contribuintes diminuam e é grande a possibilidade de aumento no consumo ou na poupança”. A medida vai, também, estimular os negócios. “O sistema tributário progressivo vai recolher recursos extras nos níveis de renda mais elevados. Com isso, não acarreta prejuízo para o Fisco ou alta substancial da dívida pública”, esclarece.
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