A Comissão de Agricultura (CRA) aprovou nesta quinta-feira (7) projeto de lei que libera a construção de reservatórios de água para projetos de irrigação em áreas de preservação permanente (APPs) à beira de rios. O PL 1.282/2019 recebeu parecer favorável do senador Esperidião Amin (PP-SC) e segue à Câmara dos Deputados, a menos que haja recurso para análise de Plenário.
De acordo com o Código Florestal (lei 12.651, de 2012), as faixas de terra que margeiam rios, tanto em áreas rurais quanto urbanas, são APPs e não podem sofrer intervenção na sua vegetação nativa, com exceção de algumas hipóteses. O projeto de lei, do senador Luis Carlos Henze (PP-RS), inclui entre essas hipóteses a instalação de infraestrutura para irrigação.
O autor do projeto argumenta que a medida se justifica pelos ganhos de produtividade que traria à agricultura brasileira sem a necessidade de expandir a área plantada, e ressalta o papel dos projetos de irrigação para a expansão da agropecuária brasileira.
“Atualmente o Brasil tem pouco mais 6 milhões de hectares irrigados, o que representa menos de 10% da área total cultivada com grãos no país. Esse número é quase nada comparado com outros grandes produtores mundiais. Na China, por exemplo, 60% das lavouras são irrigadas”, destaca Heinze em sua justificativa para a proposta. Ele também sinaliza falta de clareza na legislação atual sobre o tema, “o que dificulta a expansão das tecnologias ligadas à irrigação”.
O senador destacou problemas recentes com estiagem nos estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Para o presidente da CRA, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), o PL é importante para que todos os agricultores do Brasil entrem na legalidade na utilização e abertura de novos reservatórios de água.
— É uma medida importante para regularizar uma prática tradicional e muito necessária para a manutenção das atividades agrícolas — afirmou Gurgacz.
O relator Esperidião Amin apresentou uma emenda de redação para explicitar que a proposta altera o Código Florestal, e outra emenda que restringe a possibilidade de construção aos reservatórios que decorram de barramentos, mediante análise e autorização do poder público, e acrescenta exigências adicionais que visem à prevenção e à mitigação de impactos ambientais para a instalação das estruturas.
Entre essas exigências estão a adoção, no projeto e em sua execução, de práticas sustentáveis de manejo do solo e dos recursos hídricos (de acordo com normas dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente); o licenciamento ambiental; e a inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
A emenda também determina que a intervenção ou a supressão de vegetação nativa em APP somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental. Esperidião disse que, com as emendas, o projeto “vai permitir a construção de reservatórios d’água para irrigação decorrente de barramento mediante o cumprimento de requisitos voltados à conservação ambiental, como a necessidade de outorga pelos direitos de uso de água emitida pelos órgãos gestores competentes e a de que o projeto esteja de acordo com os respectivos planos de bacia ou planos de gestão de recursos hídricos, atendendo a posicionamento do Ministério do Desenvolvimento Regional e do Ministério do Meio Ambiente”.
Esperidião Amin considera que a iniciativa de Heinze “vem a propósito de preencher lacuna em nossa legislação, ao contemplar a possibilidade de instalação de reservatórios em APP, de modo que toda a infraestrutura necessária ao desenvolvimento de projetos de irrigação seja viabilizada. A possibilidade de instalação nessas áreas apenas das estruturas para captação e condução de água, que se resume a tubulações e bombas, tem limitado excessivamente o avanço da agricultura irrigada”, justifica.
Ele explica que as emendas que apresentou foram inspiradas (com adaptações) no parecer do senador Marcelo Castro (MDB-PI), que foi protocolado em 2019, mas não chegou a ser discutido nem votado pela CRA antes que o antigo relator deixasse de ser membro da comissão.
Esperidião afirma ainda em seu relatório que a admissão de intervenção em APP trazida pela proposta não faz qualquer tipo de restrição ou condicionalidade à manifestação de órgãos públicos competentes sobre o assunto. E destaca que a Política Nacional de Irrigação prevê a necessidade tanto de licenciamento ambiental quanto de outorga de uso da água para os projetos de irrigação. “Portanto, as atividades de irrigação não ocorrem legalmente sem autorização do poder público, como pretende o projeto em análise”, conclui.
O relator ressalta que “a construção de médios e grandes projetos de irrigação pode causar considerável impacto ambiental, mesmo que esses venham a ser eventualmente mitigados e até mesmo justificáveis do ponto de vista social e econômico”. Por isso, ele considerou importante se estabelecer condicionantes ou regulamentação, como a realização de estudos e de eventuais práticas que venham a minimizar os impactos decorrentes da intervenção sobre a APP.
Ainda explicando a emenda, Esperidião Amin argumenta que há estudos demonstrando que reservatórios utilizados para irrigação construídos a partir de barramentos de cursos d’água têm efeito positivo na disponibilidade hídrica das bacias hidrográficas durante os meses de seca. A infiltração de água no fundo desses reservatórios, apesar de consistir em perda importante do volume de água no reservatório em si, alimenta o fluxo de base dos rios, aumentando o volume de água superficial a jusante.
Barramentos muito grandes causam impactos importantes na ictiofauna (agrupamento dos peixes que vivem em determinado ambiente ou região), impedindo seu deslocamento a montante, necessário para a reprodução das espécies de piracema. “Entretanto, barramentos menores têm impactos também menores. Há uma faixa de tamanho ideal, pois reservatórios muito pequenos têm um balanço hídrico desfavorável, dado que as perdas por evaporação tornam sua relação custo-benefício negativa”, afirma.
O relator acrescenta que os reservatórios oriundos de barramentos têm uma vantagem sobre os demais. “De acordo com o Código Florestal, não se exige APP no entorno de reservatórios artificiais de água que não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água naturais. Assim, a admissão da construção de reservatórios em APP que não sejam oriundos de barramento traz a desvantagem de extinguir a APP no local, pois o reservatório construído não gerará outra APP em seu entorno. O mesmo não ocorre com reservatórios construídos a partir de barramentos, para os quais se constituem novas APP ao redor do novo espelho d’água”, justifica.
Em complementação de voto nesta quinta-feira, o relator rejeitou emenda dos senadores Jean Paul Prates (PT-RN) e Eliziane Gama (Cidadania-MA) que propunha retirar a remissão da possibilidade de intervenção em APP de faixas marginais de cursos hídricos e no entorno de lagoas e lagos naturais nos imóveis rurais com até 15 módulos fiscais, para a prática da aquicultura e a infraestrutura física diretamente a ela associada.
Esperidião considerou legítima a preocupação dos autores da emenda, “pois são de fato graves os impactos ambientais da atividade de aquicultura implantada sem as devidas salvaguardas por meio de condicionantes do licenciamento ambiental”.
— No entanto, trata-se de uma redundância. O Código Florestal traz salvaguardas essenciais para evitar e mitigar impactos ambientais da aquicultura. Entendemos, portanto, desnecessária a emenda — afirmou o relator.
Os senadores da CRA rejeitaram requerimentos que propunham audiência pública relacionada ao tema, assim como o destaque do senador Paulo Rocha (PT-PA) referente à emenda dos senadores Jean Paul e Eliziane, não acatada pelo relator.
Fonte: Agência Senado
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